voluntária da Elas
27/04/2023
O trabalho doméstico no Brasil é negro, feminino e desvalorizado. Ocupamos o 1º lugar no ranking de países com o maior número de trabalhadoras domésticas no mundo, porém ainda nos mostramos incapazes em garantir efetivamente os direitos trabalhistas e prevenção ao trabalho doméstico análogo à escravidão.
Em 27 de abril, relembramos a importante luta das trabalhadoras domésticas para o processo de conquista de direitos e reivindicação de valorização do trabalho exercido. Apesar da legislação vigente desde o ano de 2013, com a PEC das domésticas, a luta dessas trabalhadoras não se encerrou.
Nesse artigo, iremos analisar o perfil do trabalho doméstico no Brasil, a legislação existente e as principais problemáticas por trás da informalidade.
O recorte racial e de gênero no trabalho doméstico brasileiro é muito bem definido. Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), 92% do trabalho doméstico no país é realizado por mulheres, sendo que 65% delas são mulheres negras.
O principal fator capaz de explicar esse recorte é o fato de ainda estarem vivas as raízes de um passado escravocrata, em que as mulheres negras escravizadas eram obrigadas a realizar as tarefas domésticas e servirem como amas de leite para aqueles que as exploravam.
As ideias historicamente concebidas na sociedade brasileira de que mulheres, principalmente as mulheres negras e pobres, devem exercer funções de cuidado nas residências de famílias brancas, são muito propagadas, por exemplo, na mídia.
Nas telenovelas e no cinema, ainda hoje, não é incomum encontrarmos empregadas domésticas representadas, em sua maioria, por mulheres negras. Isso acaba por reforçar estereótipos que determinam a divisão social e racial do cuidado.
Além disso, há um ciclo não muito incomum no histórico das famílias de trabalhadoras domésticas no Brasil, em que o trabalho prestado é muitas vezes passado de geração para geração.
Devido ao fato de existirem ainda diversas barreiras sociais que impedem o acesso à educação, e consequentemente a melhores oportunidades de emprego, o trabalho doméstico informal passa a ser uma realidade para muitas mulheres negras das periferias.
O trabalho doméstico só foi regulamentado 30 anos após a consolidação das leis trabalhistas, em 1973. Entretanto, até abril de 2013, os direitos das trabalhadoras domésticas não eram equiparados às demais categorias de trabalho.
A PEC das domésticas, aprovada naquele ano, se mostrou como um grande avanço para a regulamentação e proteção dos direitos das trabalhadoras, garantindo até aquele momento:
No ano de 2015, ocorreu uma complementação da PEC 72/2013 incluindo-se a obrigatoriedade do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS), seguro desemprego e adicional noturno. Com a aprovação da PEC, esperava-se reduzir a informalidade do trabalho doméstico, porém isso não se concretizou.
Apesar da legislação existente, a aplicação da lei e a proteção dos direitos das trabalhadoras domésticas ainda são um impasse. Um exemplo é a informalidade do trabalho, tendo em vista que o Brasil tem hoje mais de 6 milhões de pessoas exercendo o trabalho doméstico, sendo que aproximadamente, 4 milhões não possuem carteira assinada.
Nota-se, portanto, que a existência de uma legislação que visa garantir os direitos trabalhistas às trabalhadoras domésticas não é suficiente, uma vez que apenas 33% delas são registradas.
Dentre as principais problemáticas por trás da informalidade do trabalho doméstico, é possível destacar:
Outro risco evidente resultante da informalidade e da ausência de fiscalização é o trabalho escravo. Nos últimos anos, diversas notícias sobre mulheres exploradas durante anos em residências circularam nos noticiários e nas redes sociais. O trabalho doméstico é a principal forma de trabalho escravo nos grandes centros urbanos, e por isso, a fiscalização deve ser reforçada nas grandes cidades para combater crimes dessa natureza.
A desvalorização do trabalho doméstico, o racismo estrutural que determina o perfil de quem exerce o trabalho doméstico no país, a cultura colonialista de manter “o quarto da empregada” nas residências mais ricas e a ineficiência da fiscalização por parte dos órgãos competentes são fatores que contribuem para a persistência do trabalho escravo contemporâneo.
Como então visibilizar e proteger as trabalhadoras domésticas no nosso país? Em primeiro lugar, reconhecer e garantir os direitos trabalhistas desta ocupação. É fundamental o aumento da formalização do trabalho, além da remuneração adequada.
A desconstrução social e cultural acerca da inferiorização do trabalho doméstico também é importante para a valorização da função e daquelas que a exercem; no entanto, é um processo que pode ser longo, considerando que está relacionado também como uma mudança de mentalidade.
Por fim, se torna necessário que nos debrucemos sobre a luta das trabalhadoras domésticas. Uma forma de se engajar é acompanhando as informações divulgadas nos portais oficiais dos sindicatos locais de trabalhadoras domésticas, como por exemplo, o Sindicato das Empregadas e Trabalhadores Domésticos da Grande São Paulo.
Maria Eduarda é estudante de Ciências Sociais e voluntária na Elas No Poder
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