Você não nasceu pra fazer dieta!

06/05/2021

A forma como nos alimentamos está diretamente ligada à forma como vemos, vivemos e sentimos o mundo. As escolhas alimentares que fazemos dizem muito sobre acesso, educação, política, saúde emocional, e também sobre gênero.

É importante destacar que as escolhas alimentares de mulheres e de homens seguem caminhos diferentes. Socialmente, ambos os gêneros são influenciados pelo padrão de beleza, mas historicamente o corpo feminino está no alvo dessa discussão. 

Durante toda a história, o corpo feminino foi ensinado a ser bonito. As imagens que foram criadas e o imaginário do que seria a “mulher ideal” fizeram com que mulheres no mundo todo e dos mais diferentes ambientes, classes, cores e tamanhos se sentissem completamente desencaixadas. E quem ganha com isso é a indústria da beleza, que só em 2019 atingiu a marca dos 29,62 bilhões de dólares.

A indústria da beleza

Essa indústria da insatisfação cria o problema e vende a cura. Em 2020, ano do começo da pandemia da Covid-19, foi observado um aumento expressivo nas cirurgias plásticas tipo Lipo LAD (cirurgia que cria o famoso “tanquinho”).

Neste momento, em que grande parcela da população não consegue se alimentar em quantidade e qualidade necessárias e que se exercitar ficou cada vez mais difícil devido ao isolamento social, o Brasil chegou ao primeiro lugar do ranking de cirurgias plásticas no mundo. Isso revela uma crescente insatisfação corporal da população, influenciada também pelo alto consumo de redes sociais.

Agora, o culto ao corpo tem Instagram, Facebook e LinkedIn, e todos nós consumimos seu conteúdo 24h por dia.  De acordo com dados da Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica e Estética (Isaps), 86,2% das cirurgias plásticas no mundo são realizadas por mulheres.

Vale destacar que a cultura da dieta não é algo novo. Desde os espartilhos do século XX até a harmonização facial dos tempos atuais, a mentalidade por trás desse padrão é a mesma: “alcançar o corpo ideal” a qualquer custo. Mas ideal para quem?

O padrão Barbie 

As implicações sociais na imagem corporal de mulheres faz com que todos os dias uma de nós queira ser outra pessoa. Quando paramos pra pensar que o nosso padrão de beleza é a boneca Barbie, é importante refletir: Por que a sociedade exige que sejamos parecidas com algo que nem é humano? 

Ser uma Barbie significa ser um objeto. Não só o corpo plastificado, mas todo um comportamento de obediência e submissão de uma boneca que não fala e nem pensa. Todo esse movimento fez com que as mulheres se tornassem reféns de sua alimentação e estilo de vida.

As dietas

A definição da palavra dieta é proveniente da palavra grega diaita, que significa “modo de vida”. Em outras palavras, é um conjunto de ações que a longo prazo se tornam hábitos e trazem alguma mudança. Com o passar dos anos, surgiram outros significados para essa palavra aparentemente inofensiva.

Dieta passou a ser sinônimo de perda de peso não consciente, ou seja, perda de peso obrigatória. Essas novas conotações tiraram a alimentação do seu papel fundamental de alimentar e nutrir e a colocaram como ponte para o corpo ideal, ou melhor, irreal.

No geral, as dietas foram tão bem vendidas como algo milagroso, normal e socialmente aceito que é mais fácil para as pessoas entenderem todo o protocolo do jejum intermitente ou fazerem todos os exames de um risco cirúrgico e deixarem de comer tudo que gostam sem nem saber o porquê, do que simplesmente entender que a saúde vem do equilíbrio e da liberdade de poder ser o que se é.

Simone de Beauvoir já disse que nenhum homem é realmente livre para amar uma mulher gorda. O peso tem peso. O que deveria ser só um número na balança pode ser a diferença entre ganhar um emprego ou não, começar um relacionamento ou não, sair de casa ou não.

A beleza, acima de tudo, nos deu uma visão doente do que é ser saudável. O que deveria ser visto como uma preocupação, hoje é incentivado em qualquer roda de amigos. O emagrecimento, seja ele por qualquer meio, é sempre um elogio e é sempre a solução.

O corpo como ele é

O corpo não é apenas um organismo, mas o resultado de uma construção social. Hoje o padrão de beleza é o corpo magro, branco, rico, depilado e harmonizado. Porém, amanhã pode ser outro, e assim vamos aprendendo a nos fantasiar das expectativas alheias e nos perdemos nessa ilusão de nos encontrar.

Como dito por uma amiga próxima que resumiu perfeitamente esse tema, as mulheres não nasceram pra fazer dieta e sim para fazer revolução. Hoje, o movimento corpo livre, body positive e do amor próprio estão ganhando cada vez mais espaço e libertando mulheres dessa saga de satisfazer o patriarcado. É preciso incentivar a normalização de corpos reais e acabar com essa ditadura da beleza que mata mulheres todos os dias.

A ideia de uma nutrição mais real, menos restritiva e mais gentil com nossos corpos não é uma novidade “diferentona” para instigar um autocuidado superficial. Ela é o respiro para corpos que passaram anos tentando se encaixar em algo pequeno demais para eles. É um espaço para entender que existem corpos diferentes, saudáveis, e lindos por serem o que são. 

Ser mulher já é um ato de resistência, mas ser uma mulher com poder para mudar parâmetros alimentares é o começo de uma revolução! E a Nutrição pra mim é isso: é ter na mão o conhecimento para libertar, para informar e para mudar esse mundo tão magro de empatia, humanidade e resiliência.

 

Texto de Marianna Azeredo. Graduanda em Nutrição pela UFRJ, carioca, 23 anos, Marianna sempre sonhou com uma Nutrição mais gentil e real. Começou seu perfil profissional na pandemia abrindo um canal pra falar sobre autonomia alimentar, autocuidado, e a nossa relação com a comida.

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