Ser menina e buscar por espaço é um ato político

Milena Oliveira

voluntária da Elas

12/10/2021

Ser criança é muito bom. Mas ser criança e menina é um pouco diferente. Nascer mulher, há muito tempo, é ter que carregar o peso da resistência. É ter que saber, todos os dias, procurar o seu lugar e o seu espaço. Meninas que fazem sua história e mostram suas vozes ainda assustam, mas é o melhor remédio para combater a desigualdade entre os gêneros.

Muitas meninas foram proibidas de praticar alguns esportes ou privadas de escolher determinada carreira. Muitas nem sequer foram à escola. Aqui no Brasil, elas só conseguiram o direito de se matricular nos cursos superiores no século XIX, através do decreto de lei nº 7.247 de 19 de abril de 1879.

Mas por que é tão importante que meninas ocupem espaços políticos?

Você já ouviu falar em Greta Thunberg, Malala Yousafzai, Fatou N’diaye e Ana Julia Ribeiro? Todas essas meninas têm algo em comum: são garotas que mostraram (e continuam mostrando) ao mundo como as mulheres são fortes na luta pela igualdade e que para ter posicionamento político, não importa idade. Em uma sociedade machista e patriarcal, elas mostram como nós, mulheres, conhecemos a dor de ter de suportar o machismo e a desigualdade de gênero todos os dias. 

“Se alguém pensa que o que eu e a ciência estamos dizendo é defender uma visão política – isso diz mais sobre essa pessoa do que sobre mim.” (Greta Thunberg, 2019)

Greta é uma jovem sueca, de 16 anos, que ganhou visibilidade ao cobrar que autoridades combatam o aquecimento global, tornando-se uma das principais vozes sobre assuntos climáticos. A estudante ganhou destaque em assembleias e encontros globais para discutir sobre as mudanças do clima no mundo todo. 

A ativista apresentou uma queixa formal à Organização das Nações Unidas (ONU), mais especificamente, ao Comitê dos Direitos da Criança. A denúncia, feita em conjunto a outros 15 jovens ativistas (de 8 a 17 anos), pede que os países criem medidas para proteger as crianças dos efeitos da crise climática. 

Malala é uma jovem paquistanesa que ficou mundialmente conhecida em 2012, quando foi baleada na cabeça. À época, com 15 anos, o tiro veio de talibãs que eram contrários à educação de mulheres. O desejo da ativista era que meninas e adolescentes do Paquistão pudessem exercer o direito de ir à escola e adquirir conhecimento.

“Quando o Talibã assumiu minha cidade natal no Vale do Swat, no Paquistão, em 2007, e logo depois disso proibiu as meninas de receberem educação, escondi meus livros sob meu xale longo e pesado e caminhei para a escola com medo.” (Malala, 2021)

Devido ao seu histórico de luta, em 2014, ela foi a vencedora do Prêmio Nobel da Paz. Sua história ficou tão conhecida que virou livro “Eu sou Malala: A história da garota que defendeu o direito à educação e foi baleada pelo Talibã”, escrito por ela mesma, e o documentário “Malala”, disponível na Netflix.

Meninas brasileiras também fazem história 

Todos os dias as meninas precisam mostrar sua força, ainda mais as meninas negras, que enfrentam preconceitos “cruzados”. Ndeye Fatou N’diaye, uma jovem de 15 anos, ficou conhecida pelo racismo sofrido por colegas de escola. Ela foi tema de uma série de mensagens trocadas por adolescentes de um colégio frequentado por membros das classes mais altas do Rio de Janeiro. 

Após os inúmeros ataques sofridos, as redes sociais da estudante foram inundadas de mensagens de amor e afeto. Fatou usa o Instagram para promover a África Arte, e na escola ela é uma das melhores alunas da instituição, na qual já ganhou diversos prêmios, sobretudo relacionados com poesia. 

“Eu não fiquei triste porque eu sei quem eu sou, eu sei qual é a minha história, não vou deixar pessoas que não conhecem nada de mim me abalarem.” (Fatou, 2020)

Lutar contra os cortes de investimentos nas escolas públicas com a PEC 241, uma proposta de reforma do Ensino Médio depois da chegada do governo Temer, era o objetivo de centenas de jovens que ocupavam escolas pelo país. Ana Júlia Ribeiro, aos 16 anos à época, ficou nacionalmente conhecida por dar voz a esses estudantes. 

A jovem defendeu no Plenário da Assembleia Legislativa de Curitiba os alunos que ocupavam as mais de mil escolas do país, em outubro do mesmo ano, em nome de mudanças no ensino médio. O discurso mudou a vida da adolescente em poucas horas. A repercussão da fala ultrapassou as paredes da Assembleia e atingiu milhares de brasileiros após um vídeo ser divulgado e viralizar nas redes sociais.

“Excelentíssimo senhor presidente, excelentíssimos senhores deputados e a todos os demais presentes, boa tarde. Eu sou Ana Julia, estudante secundarista do Colégio Estadual Senador Manoel Alencar Guimarães. Tenho 16 anos e estou aqui para conversar com vocês sobre as ocupações. A minha pergunta inicial é: de quem é a escola? A quem a escola pertence?” (Ana Júlia, 2016)

“Não podemos desistir, nossa luta de hoje, garante os direitos de amanhã”

Sophia Rodrigues, de 14 anos, é exemplo de menina que busca pelo seu espaço. Para ela, ser mulher no mundo que a gente vive não é fácil, pois as pessoas vão sempre tentar diminuir os seus maiores feitos. “Nós não podemos desistir, temos que lutar e conquistar nosso espaço, a nossa luta de hoje, garante os direitos do amanhã.”

Assim como Greta, Sophia adora assuntos relacionados às mudanças climáticas. Poderíamos descrevê-la como uma pequena grande ativista, pois com a pouca idade ela já entende que é importante buscar conhecimento sobre política e buscar o seu espaço no mundo, através de muito estudo.

Consumidora de assuntos sobre as metas da Organização das Nações Unidas (ONU), saúde mental e feminismo, Sophia é voluntária de um perfil de política no Instagram e fala que o processo de criação é importante, pois ela se informa e aprende da melhor forma possível.

“Acho fascinante como nós não nos atentamos aos pequenos detalhes da nossa própria história ou política, detalhes que muitas vezes parecem ‘’bobos’’, mas nos ajudam a entender com mais clareza diversos acontecimentos, falhas e até mesmo vitórias ao longo do tempo.”

O fato é que vivemos uma sociedade extremamente machista, e mesmo com muitos avanços, ser mulher no Brasil é um ato de resistência. Mas Sophia sabe, que se estamos onde estamos, e temos ‘’direitos iguais’’, é porque muitas mulheres lutaram antes de nós.

Segundo a garota, o conhecimento é a chave para nos fortalecer e mudarmos a realidade em que vivemos. “Ter consciência na hora de votar, por exemplo, é um impacto direto da educação. E, principalmente, para nós mulheres, as escolhas políticas e sociais têm um impacto ainda maior, por isso estou sempre ativa no que diz respeito ao meu futuro e ao de milhões de outras mulheres”.

Ainda precisamos avançar muito na representatividade feminina na política

Estamos em 2021, e o Brasil perde para quase todos os países da América Latina em percentuais de participação política de mulheres. As mulheres são 15% dos integrantes na Câmara Federal. Mesmo com todos os problemas, o Parlamento do Afeganistão tem 27% de mulheres.

O Brasil ocupava, em julho, a posição 140º no que se refere à participação política feminina, em uma escala que contempla 192 países pesquisados pela União Interparlamentar. O País está atrás de todas as nações da América Latina, com exceção do Paraguai e do Haiti.

As meninas são a esperança na mudança social que o Brasil precisa. Meninas, vocês têm potencial para mudar o mundo. Parece grande pensar assim, mas só nós podemos conseguir mudar o rumo de nossas histórias. Já avançamos muito, adquirimos muitos direitos, mas ainda precisamos de mais reconhecimento. A presença feminina deve estar em todos os espaços, porém, é necessário coragem para estarmos na linha de frente da luta pelos nossos direitos.

 

Milena Oliveira, 25 anos, jornalista e pôs-grudanda em Comunicação Organizacional e Estratégias Digitais. Apaixonada por leitura, jiu-jítsu e confeitaria.

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