Racismo ambiental: o que o conceito tem a ver com mudança climática?

Fernanda Paixão

voluntária da Elas

19/11/2021

“Não há como falar de mudança climática sem falar de pessoas”, disse Txai Suruí à revista Exame. Para quem não a conhece, Txai é uma jovem indígena ativista brasileira que luta pelos direitos dos povos originários. Ela foi a única mulher do país a discursar na abertura da Conferência da Cúpula do Clima (COP26), em Glasgow, na Escócia.

Ao longo de duas semanas, representantes de 197 nações, ONGs e empresários debateram e negociaram medidas mais ousadas para frear a crise climática. São promessas de investimento em energia renovável, combate ao desmatamento, redução da emissão de carbono, tudo para evitar que a população mundial sofra ainda mais com os impactos da crise climática.

Mas o discurso feito pela jovem estudante de Direito na abertura da conferência e o resultado desanimador da COP26 expõem uma realidade ignorada pelas nações, e principalmente pelo Brasil, ao traçar tais metas para o futuro: o racismo ambiental. Sim, esse conceito existe e tem tudo a ver com a mudança climática. São pessoas e nações mais pobres que pagarão a conta das mudanças climáticas.

O que é racismo ambiental

Segundo Benjamin Franklin Chavis Jr., racismo ambiental “é a discriminação racial nas políticas ambientais”. Ela ocorre quando a aplicação de práticas ou leis coloca um grupo em desvantagem em relação ao outro, intencionalmente ou não, por causa da cor da pele.  

O conceito foi criado na década de 80 por Benjamin Chavis, líder do movimento de direitos civis nos EUA que, quando jovem, foi assistente de Martin Luther King. À época, um processo judicial sobre a criação de um aterro sanitário em Warren County, na Carolina do Norte, despertou a curiosidade do ativista sobre o tema.

A corte negou a construção de um aterro de PCB (bifenilpoliclorado) na região, que era habitada majoritariamente por negros. O caso abriu precedente que relaciona a escolha da abertura de aterros sanitários a bairros de população negra. Após a decisão, o ativista tomou conhecimento de vários outros casos semelhantes espalhados pelo país.

No Brasil, esse conceito é mais amplo, abrangendo indígenas, quilombolas, comunidades ribeirinhas. Em suma, populações em situação de vulnerabilidade. E vulnerabilidade ambiental. São esses grupos os mais atingidos por mudanças climáticas.

Muitas das consequências dessa crise já são conhecidas pelos brasileiros. É só lembrar de tragédias como Mariana e Brumadinho, nos quais a população ainda sofre com as consequências dos desastres. Ele se dá pela falta de acesso a saneamento básico, na maior exposição a catástrofes climáticas como enchentes e deslizamentos, em processos de gentrificação, na instalação de fábricas, indústrias e aterros sanitários em bairros habitados por pessoas negras e pobres, podendo comprometer a saúde dessa população.

Num cenário macro, as nações mais pobres sofrem mais em comparação às mais consolidadas economicamente. No dia 6 de novembro, ainda no início das negociações, o ministro de Tuvalu, uma ilha no meio do oceano Pacífico, gravou um discurso com o mar na altura dos joelhos para alertar sobre o aumento do nível do mar. Seu território, assim como muitos outros, corre o risco de desaparecer debaixo d’água por causa do aquecimento global. 

Participação política ajuda a combater o racismo ambiental

A presença de mulheres como Txai Suruí e Amanda Costa, delegada do Brasil no G20 Youth Summit e diretora executiva do Perifa Sustentável, na COP26 é um ato político. Além de medidas que protejam o meio ambiente, elas buscam representatividade política e visibilidade para que vidas brasileiras sejam realmente levadas em consideração.

Para isso, um dos caminhos é eleger minorias sociais para os governos estaduais e federais, ajudando a criar e debater leis e políticas públicas que promovam justiça climática – que os tire dessa situação de desvantagem econômica e social constante.

Hoje há apenas uma representante indígena no Congresso Nacional. Seu nome é Joenia Wapichana, deputada federal pela Rede-RR.  De acordo com a Agência Câmara de Notícias, 197 indígenas foram eleitos para os cargos de prefeito, vice-prefeito e vereador em 2018. O número é maior do que em 2016, mas permanece muito baixo para quantidade de povos que existem em território nacional. Sem falar na quantidade de negros e mulheres – que também estão entre os grupos mais atingidos.

Para além da representatividade, cumprir as promessas feitas na Conferência do Clima, exigira do Brasil muitas mudanças, dentre elas, o posicionamento negacionista quanto ao desmatamento ilegal e o reconhecimento de conceitos como o racismo ambiental – que não são novos, mas batem à porta com extrema urgência.

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