Protocolo de Barcelona: o que o Brasil pode aprender com o Caso Daniel Alves?

Elisa Dinelli

voluntária da Elas

19/04/2023

É muito provável que você tenha lido, ouvido ou assistido a notícia do caso Daniel Alves em Barcelona quando, na segunda quinzena do mês de janeiro, uma jovem, em uma noite qualquer, saiu com amigas para se divertir e acabou tendo que enfrentar o maior medo de todas mulheres: sofrer violência sexual.

Poderia ser uma história como várias outras que, infelizmente, são tão comuns. 

Porém, elementos em particular trouxeram maior impacto para que, durante meses, a discussão estivesse por toda parte: um jogador celebridade, quatro versões contraditórias dadas por ele sobre o que teria acontecido e um certo protocolo para acolhimento de vítimas de importunação e violência sexual.

Com relação aos dois primeiros elementos, peço permissão ao leitor para ignorá-los. 

A narrativa dos fatos reportados pelos jornais estão em outras centenas de textos fáceis de serem encontrados na internet. 

É o terceiro elemento desta história que nos interessa aqui.

Não demorou muito para que Daniel Alves se apresentasse à juíza do caso e preso. Mais especificamente em 20 de janeiro, pouco mais de vinte dias do ocorrido. 

Para Esther García Lopez, a advogada da vítima, esta rapidez se deve à abundância de indícios de que houve violência sexual. 

Ela disse: “É um caso com mais indícios do que o comum, de fato, mas eu não acho que seja porque o denunciado é um personagem público. Há mais indícios porque as coisas foram feitas de forma imediata”.

O protocolo de Barcelona e o acolhimento às vítimas de violência sexual

Há um motivo bastante específico do porque há tantos indícios do suposto crime de estupro: um protocolo estabelecido na cidade de Barcelona.

Nele, os funcionários de estabelecimentos privados de diversão são orientados a, no caso de identificarem que alguém está com sinais de que foi abusada ou violentada, acolherem a vítima e informarem de que ela tem o direito de ter apoio médico e psicológico naquele momento, mesmo que se decida a não prestar depoimento à polícia, posteriormente. 

No caso da Sutton, boate em que a jovem teria sido atacada por Daniel Alves, a mulher foi abordada por um garçom do estabelecimento e saiu da casa noturna de ambulância, direto para um hospital. 

Lá, fez exames de corpo de delito, onde foi possível coletar evidências de suas roupas e de seu corpo. 

A jovem também teve acesso ao coquetel retroviral e contraceptivo de emergência e teve conhecimento de seus direitos diante do suposto crime. 

As evidências coletadas tão rapidamente e o depoimento da mulher, feito já no dia 2 de janeiro, fizeram parte do pedido de prisão do jogador feito pelo Ministério Público e acatado pela juíza do caso, María Concepción Cantón Martín. 

O que se viu na Espanha é o que se vê no Brasil? 

Lei não significa mais segurança.

Segundo Marina Ganzarolli, advogada e fundadora do Me Too Brasil, há um eixo de prevenção e treinamento e também um eixo de resposta no caso do combate à violência sexual dentro do protocolo da prefeitura de Barcelona. 

Segundo ela, o país europeu tem uma das melhores leis do mundo para a defesa das mulheres, que é a lei de proteção integral contra a violência de gênero, de 2004. 

Desde esta época, a Espanha mostrou que entende a violência contra as mulheres como um caso de segurança pública – e não só com um problema de esfera privada -, e isso é muito importante. 

Contudo, o Brasil não está completamente atrasado na questão da legislação, uma vez que temos a Lei do Minuto Seguinte (2013) e a Lei de Importunação Sexual (2018). 

A primeira determina que toda vítima de violência sexual deva ter atendimento prioritário e de emergência no SUS (mesmo sem ter feito boletim de ocorrência), onde terá apoio médico e psicológico. 

Já a Lei de Importunação Sexual muda a ótica de que a violência só ocorre se houver grave ameaça ou violência à vítima, entendendo que o crime ocorre sempre que houver ato libidinoso sem o consentimento da outra pessoa. 

O que nos falta é educação e investimento na preparação e treinamento de agentes médicos e de segurança pública. 

O que foi importante no caso ocorrido em Barcelona não foi uma lei que tipificasse, ou seja, caracterizasse a violência ocorrida como um crime. 

O que fez toda a diferença foi a preparação de todas as pessoas que tiveram contato com a jovem após o ocorrido.

Fontes: 

Podcast “O Assunto” de 27 de janeiro de 2023

Folha de S. Paulo

 

Elisa Dinelli é coordenadora de Redes Sociais da Elas no Poder. É formada em Relações Econômicas Internacionais pela UFMG, trabalha com internacionalização da educação e é  ativista pela igualdade de gênero. Ama cinema e podcasts.

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