A luta feminina negra pela liberdade resiste: a abolição no Brasil e seus reflexos

Sabrina de Almeida

voluntária da Elas

29/05/2023

Neste mês de maio, a Lei Nº 3.353, mais conhecida como Lei Áurea, completou 135 anos. Sancionada em 1888, a lei trouxe a extinção do trabalho escravo no Brasil, tornando-o o último país do ocidente a abolir a escravidão. 

Diante desse cenário, é importante reconhecer que não há motivos para comemorar em 13 de maio e que a abolição foi resultado de intensas lutas sociais, com destaque para a resistência e luta dos próprios escravizados.

Luta contra abolição: as mulheres que resistiram ao sistema

É correto afirmar que as pessoas escravizadas no Brasil não foram passivas durante o período da escravidão. Ao contrário, houve uma constante luta e resistência ao longo dos três séculos em que o sistema escravocrata vigorou no país, incluindo a ativa participação das mulheres negras.

Mulheres negras, tanto libertas como escravizadas, desempenharam um papel fundamental na luta e resistência à escravidão. Exemplos notáveis incluem Maria Firmina dos Reis, Adelina e Anastácia.

Maria Firmina dos Reis, filha de uma mulher alforriada, teve a oportunidade de receber uma boa educação e formação escolar, pois foi criada por sua tia. Ela se tornou a primeira romancista negra do Brasil e seu livro “Úrsula”, publicado em 1859, é considerado o primeiro romance abolicionista escrito por uma mulher na língua portuguesa. 

Através de sua obra, Maria Firmina denunciou as terríveis violências sofridas pelas pessoas escravizadas. Além de suas contribuições literárias, ela também foi uma educadora ativa, atuando como professora e defendendo a educação gratuita.

Diferentemente de Maria Firmina, Adelina não nasceu liberta. Sua alforria foi prometida por seu próprio pai, que produzia charutos vendidos por ela, mas essa promessa foi negada.

O contato de Adelina com a sociedade, por meio da venda de charutos, permitiu que ela contribuísse para a luta abolicionista, desempenhando um papel importante na busca pela libertação das pessoas escravizadas.

Anastácia, assim como Adelina, também era uma mulher escravizada e um símbolo de resistência. Ela corajosamente se opôs às violências às quais era submetida, sendo constantemente violada e agredida. 

Anastácia foi covardemente silenciada por uma Máscara de Flandres, uma máscara de ferro que foi colocada em sua boca e que permaneceu com ela pelo resto de sua vida.

Além de sua resistência, Anastácia também era uma curandeira e era reconhecida por suas mãos milagrosas, o que lhe rendeu o título de “Santa Popular Brasileira”.

Abolição: desigualdade e exclusão 

Nosso papel é evidenciar a relevância da atuação dessas mulheres no processo que levou à abolição da escravatura, tanto resistindo ao sistema escravocrata como também atuando na causa abolicionista. 

No entanto, é importante destacar que o dia seguinte à sanção da Lei Áurea ainda não chegou ao fim. Apesar da luta incansável pela liberdade, a população negra ainda hoje não provou o doce prazer da igualdade. 

A lei sancionada no dia 13 de maio de 1888 não previu a integração dos novos libertos e libertas; pelo contrário, nos anos seguintes, a população negra brasileira foi marginalizada e excluída da sociedade.

Não foram implementadas políticas públicas que sequer integrassem as pessoas negras como cidadãs, portadoras de uma igualdade racial que nunca foi alcançada. 

O que aconteceu no pós abolição: a resistência feminina negra ainda persiste

Com a política de branqueamento promovida pelo Estado, que incentivava a vinda de imigrantes europeus e a implementação da Lei da Vadiagem, que previa a prisão para aqueles sem emprego, as elites e o Estado ampliaram a desigualdade racial e o racismo. 

Essa política buscava promover uma “higienização urbana”, especialmente por meio da Lei da Vadiagem, que restringia a liberdade dos novos libertos, já que eles eram a maior parte dos desempregados e sua mão de obra no meio urbano era desvalorizada.

Dessa forma, os novos libertos eram indesejáveis para a sociedade e também para o Estado, que não hesitou em promover a segregação, mantendo intacto o sistema estrutural escravocrata.

Com o fim do Império em 1889 e o início da República, a situação permaneceu inalterada e até piorou: a República favoreceu um esquecimento coletivo de que um dia houve escravidão.

As consequências da falta de políticas públicas que integrassem o liberto à sociedade e a promoção de políticas que o marginalizavam e o segregavam ainda permeiam fortemente a atualidade.

Apesar da luta das mulheres que buscavam o fim da escravidão, a abolição por si só não bastou; pelo contrário, manteve a população negra vulnerável.

Hoje, mulheres negras continuam travando uma luta contra o racismo, buscando seu lugar nos espaços políticos, econômicos e sociais, rumo ao desejo de que a igualdade e liberdade do povo negro não sejam uma utopia. 

Mulheres como Sueli Carneiro, Conceição Evaristo, Marielle Franco, esta última tendo tido a sua vida ceifada por exercer seu direito de luta, são exemplos dessa resistência. 

Definitivamente, o dia 13 não é um dia de comemoração, mas sim um dia de reflexão sobre uma luta contínua que permeia por mais de 4 longos séculos de sangue, sofrimento e desigualdade.

 

 

Por Sabrina de Almeida. Sabrina é graduanda em História e voluntária de comunicação da #Elasnopoder. Na luta por uma sociedade onde as mulheres tenham protagonismo que merecem.

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Comentários (1)

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Lidia de Almeida 31 de maio de 2023 Texto maravilhoso e super consciente até hoje temos sim essa desigualdade. Por mais mulheres no poder, muito orgulho da mulher que a Sabrina se tornou.
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