voluntária da Elas
15/07/2021
Você sabia que antes da urna eletrônica as urnas eram de madeira até a década de 1950? E que pouco tempo depois e com intuito de facilitar o transporte e armazenagem, passaram a ser de lona? Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), até 1996, a apuração de votos no Brasil consumia horas, dias e até semanas. E como tudo era manual, erros e trapaças eram comuns.
Com a chegada da urna eletrônica há 25 anos, muitas coisas mudaram: resultados mais rápidos e seguros tornaram-se realidade. Porém, a urna eletrônica está longe de viver seus melhores dias, o debate em torno do voto impresso auditável voltou como uma espécie de maldição que a persegue desde o seu nascimento.
Nestes 25 anos de urna eletrônica, o Congresso Nacional aprovou em três ocasiões o voto impresso, mas todas elas, contudo, foram derrubadas. A primeira vez foi em 2002 e nas eleições desse mesmo ano, a Justiça Eleitoral pôs em prática o voto impresso paralelo ao voto eletrônico, como teste, em apenas 150 cidades. Segundo o TSE, a experiência não trouxe mais segurança ou transparência, provocou filas maiores e várias urnas apresentaram defeitos. Atendendo ao pedido da Justiça Eleitoral, o Congresso Nacional revogou a lei do voto impresso um ano depois.
Em 2009, o debate tomou força novamente, chegando a ser aprovada uma lei, posteriormente derrubada pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Isso se repetiu com a minirreforma eleitoral aprovada em 2015 pelo Congresso Nacional. A medida foi proposta pelo hoje Presidente da República e então deputado federal pelo PSC, Jair Bolsonaro. Porém, a lei foi derrubada novamente pelo STF em 2018 por inconstitucionalidade.
Já em 2019, a deputada federal, Bia Kicis (PSL-DF), propôs uma Proposta de Emenda a Constituição (PEC 135/2019), para acrescentar dispositivo na Constituição que estabeleça a impressão dos votos. Recentemente, a Câmara deu os primeiros passos para debater a PEC com a criação de uma comissão especial que tem como relator o deputado Filipe Barros (PSL/PR), integrante da base governista e que acaba de apresentar seu parecer, favorável à aprovação da PEC.
A urna eletrônica já e auditável, e os testes de segurança e a experiência democrática demonstram que os resultados são seguros. Porém, o voto impresso auditável gera uma sensação de segurança maior, o que pode fazer essa opção parecer mais atraente para o eleitor.
Por outro lado, aumenta o risco de manipulação eleitoral na hora de auditar as impressões. Isso porque a auditoria depende em última instância da manipulação dos papéis para comprovação, e poderia ser fraudado em caso de dúvidas ou recontagem. Quanto mais intervenção humana, maior é a possibilidade de fraude.
Ao mesmo tempo, a introdução do voto impresso auditável pode favorecer a proliferação de rumores de manipulação e acabar judicializando os resultados eleitorais. Os candidatos derrotados poderiam alegar fraude na votação eletrônica e pedir a contagem dos votos impressos apenas para pôr em dúvida a legitimidade da vitória dos adversários e, assim, fragilizá-los politicamente.
Outro problema apontado pelo TSE é que, a cada dois anos, será necessário montar um grande esquema logístico para garantir o transporte e o armazenamento seguro dos votos dos 148 milhões de eleitores brasileiros.
Para a maioria dos especialistas, dado que o atual sistema funciona sem problemas, porque trocar o certo pelo incerto? Além disso, o custo de implementação do voto impresso auditavel é outro dos questionamentos. Estima-se que seria necessário um investimento de mais de R$ 2,5 bilhões, segundo o TSE.
A confiança nas instituições democráticas e no processo eleitoral são fundamentais para a democracia. Porém, desde 2018 vem ocorrendo um questionamento constante do sistema, com alegações de fraude e até divulgação de fake news. Vale a pena mencionar que a própria deputada Bia Kicis contratou uma empresa para mobilizar apoios e articular a pauta.
Diante desse cenário, o próprio TSE iniciou uma forte campanha de divulgação sobre a segurança da urna eletrônica, iniciativa apoiada também por muitos canais de comunicação. Segundo a pesquisa encomendada pela Confederação Nacional do Transporte (CNT), 64% dos brasileiros afirmaram ter confiança elevada ou moderada nas urnas eletrônicas, porém 58% se disseram favoráveis à impressão do voto.
Não há sistema perfeito que garanta que não haverá nenhum tipo de fraude. Porém, quando se diz que há fraudes na urna eletrônica e não se apresentam provas, constrói-se a ideia de que o sistema eleitoral não é confiável, corroendo a confiança no processo eleitoral e na própria democracia.
Essas falas têm se tornado cada dia mais fortes por parte do Presidente e dos apoiadores do voto impresso auditável. Por outro lado, também vem ocorrendo uma mobilização em prol do sistema atual. Presidentes de 11 partidos políticos, incluindo legendas aliadas ao governo Jair Bolsonaro, decidiram dar início a um “movimento coletivo” contra a adoção de mecanismos de voto impresso.
Diante de tantas fake news e desinformação, o debate do voto impresso auditável vem se tornando cada vez mais um problema, ao invés de um debate. Debater a democracia e procurar formas mais seguras de votar é saudável e desejável. Porém, precisamos ser cautelosos e responsáveis para não desacreditar o sistema eleitoral e os resultados sem provas. A linha é tênue, mas as consequências podem ser grandes.
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