coordenadora da Elas
01/07/2021
Não é novidade para ninguém que nós aqui da Elas no Poder temos como missão de vida encurtar a distância percorrida por mulheres até a política. Apoiá-las para superarem os obstáculos que, muitas vezes, são muito maiores para elas do que para eles. Nós treinamos mulheres, buscamos voluntárias para suas campanhas, estimulamos o voto em mulheres. Mas tem um elemento mais forte que qualquer treinamento que possamos fazer quando falamos de mulheres na política: as regras do nosso sistema.
As regras do sistema eleitoral têm o poder de mudar rapidamente a cara da política de um país. Basta olhar para o México ou a Argentina que, com cotas em cadeiras do parlamento, tiveram avanços enormes em pouquíssimo tempo. Ambos reservaram assentos para mulheres: ou seja, independentemente da votação, aqueles assentos necessariamente seriam ocupados por mulheres. Os partidos desses países se viram obrigados a investir em candidaturas femininas, e o cenário político mudou radicalmente.
Nossa cota, no Brasil, é de reserva de 30% das candidaturas de uma chapa. Antigamente, nem 30% dos recursos iriam para elas, mas uma resolução do Tribunal Superior Eleitoral mudou isto. Mas, desnecessário dizer, isso ainda é pouco. Depois de décadas da cota de candidaturas, ainda somos somente 15% das cadeiras do Congresso Nacional.
Com a reforma política que vem se desenvolvendo no Congresso, corremos o risco de retroceder ainda mais. Isso porque o que está sendo discutido é o “distritão”, um sistema político que só existe no Iraque e em outros poucos países. O sistema basicamente transforma todo o estado em um distrito, e transforma as candidaturas ao legislativo, todas, em majoritárias: quem tem mais votos, leva. Simples assim.
Ele torna as candidaturas mais caras. Faz com que pessoas famosas e conhecidas levem muito mais vantagens. E diminui a representatividade: um estudo do Movimento Acredito demonstrou que 4 mulheres e 8 negros e indígenas perderiam suas cadeiras se as últimas eleições tivessem sido feitas na lógica do “distritão”. Com isso, daríamos um passo atrás na representatividade como um todo. Um verdadeiro retrocesso na política brasileira.
Além disso, temos uma oportunidade enorme desperdiçada. Como comentei antes, já foi mais que comprovada a importância de cotas de cadeiras para uma mudança real na representatividade feminina. No entanto, há poucas chances reais que uma proposta como essa seja aprovada no Congresso. Nem uma Proposta de Emenda à Constituição que reservava 15% das vagas (a mesma porcentagem que temos hoje) teve chances, no final do último ano. Ela foi retirada de pauta por desacordo de vários líderes partidários, que reclamavam que “logo teremos cotas para todos os grupos, e como eu irei me eleger?”
A Bancada Feminina de fato protocolou 7 emendas, que garantem de 30 a 50% de reserva de vagas para mulheres, por meio de diferentes mecanismos. São, em grande parte, deputadas determinadas e que lutam pelos direitos das mulheres — mas, infelizmente, estão longe de serem maioria. Em um Congresso extremamente machista, há poucas chances de que as emendas sejam de fato aprovadas.
Por isso é tão importante garantirmos que não teremos retrocessos no sistema eleitoral. Nós, organizações da sociedade civil, trabalhamos arduamente todos os dias contra um sistema que, como está, já exclui mulheres. Mas nosso trabalho pode ser muito mais facilitado — ou dificultado — com mudanças nas regras institucionais. É essencial que acompanhemos de perto essas reformas, para que elas não coloquem ainda mais obstáculos no caminho de tantas mulheres corajosas que escolhem o caminho da política.
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