O PMB no leque presidencial

25/03/2021

Nas últimas semanas, a possível filiação do presidente Jair Bolsonaro ao Partido da Mulher Brasileira (PMB) foi recebida com surpresa por parte da sociedade. Primeiro, porque Bolsonaro está há quase 17 meses sem integrar uma legenda. Durante este período, sinalizações a diferentes partidos foram feitas, sem que nenhuma se concretizasse. Segundo, pela simbologia de uma legenda que traz em seu nome a mulher brasileira, mas é constituída majoritariamente por homens e possivelmente por um presidente que coleciona uma série de declarações que endossam a discriminação de gênero. 

Aqui, abro parênteses para dizer que na política nada é estático: alguns dias após a aproximação ao PMB, a grande mídia já trazia a possibilidade de retorno de Bolsonaro ao Partido Social Liberal (PSL), diante de um possível embate com Lula em 2022. Apesar disso, a porta aberta pelo PMB e o aceno presidencial ao partido merecem atenção, afinal, como diz um ditado popular, tudo só acaba quando termina.

Histórico do presidente

Em novembro de 2019, o presidente anunciou a sua saída do PSL após uma série de desentendimentos com o presidente da agremiação e outros parlamentares da legenda. Bolsonaro, que já colecionava uma série de filiações partidárias, passou então a procurar um novo partido. Entre o final de 2019 e março deste ano, várias possibilidades foram lançadas, mas nenhuma chegou a ser firmada pelo chefe do Poder Executivo.

Com aproximação das eleições de 2022 e movimentações de possíveis adversários, a busca por uma legenda tornou-se mais urgente para o presidente. Enquanto os demais partidos cotados eram deixados de lado, a aproximação ao PMB deixou boa parte das mulheres brasileiras, no melhor dos eufemismos, bastante surpresas.

Apesar do PMB não vincular sua bandeira à agenda política feminista, o partido afirma em seu site ter o compromisso com a valorização social, moral, profissional e política da mulher brasileira. Porém, a possibilidade de filiação de Bolsonaro à legenda parece ser uma medida que entra em choque com os ideais que a agremiação afirma ter compromisso. Durante toda sua vida política, Bolsonaro sempre deixou seus preconceitos disfarçados de liberdade de expressão muito evidentes. Ele acumulou uma série de declarações sórdidas que desrespeitam e fortalecem a cultura do preconceito de gênero, raça, sexualidade e religião.

Declarações de Bolsonaro

Em 2014, Jair Bolsonaro disse: “por isso o cara paga menos para a mulher [porque ela engravida]”. Ainda neste mesmo ano, declarou: “ela não merece [ser estuprada] porque ela é muito ruim, porque ela é muito feia, não faz meu gênero, jamais a estupraria. Eu não sou estuprador, mas, se fosse, não iria estuprar porque não merece”. 

Em 2016, endossou mais uma vez a diferença salarial por gênero dizendo que “não empregaria mulheres e homens com o mesmo salário”.  Em 2017, ao falar sobre seus filhos, afirmou: “foram quatro homens. A quinta eu dei uma fraquejada, e veio uma mulher”.

Não bastassem as declarações polêmicas, ao avaliar a condução das políticas públicas governamentais destinadas à mulher, fica nítido o descompromisso com a construção de uma sociedade mais igualitária. Em 2020, por exemplo, enquanto os índices de violência doméstica e de feminicídio cresciam no país, o Governo Federal sinalizou não ser necessário fortalecer o orçamento destinado a Secretaria da Mulher. A Secretaria é responsável pelo Programa Casa da Mulher Brasileira, uma rede de unidades de atendimento integrado para vítimas de agressões físicas e psicológicas.

As contradições da possível filiação

Considerando que a função primordial de um partido é garantir que os ideais e princípios de seu eleitorado possam ser representados nas instâncias de poder, pergunto: como pode se manter o compromisso com a valorização da mulher, quando se cogita inserir em seu corpo representativo, alguém cujas as ações refletem o que há de mais arcaico na sociedade?

A representação demanda mais que a inclusão de mulheres no nome de uma agremiação partidária. É necessário  adotar medidas que rompam com o status quo da política brasileira, que insiste em dizer que o perfil apto a integrar a política tem gênero (homem cis), sexualidade (heterossexual) e raça (brancos) bem definidos. Representação é também assumir a responsabilidade de combater ações que fortaleçam a estrutura patriarcal e racista da nossa sociedade, pilares centrais para o distanciamento da mulher à igualdade de gênero e racial.

Afinal, como já afirmou a cientista política Iris Marion Young, “não há democracia, se dentro dos espaços de deliberação pública, exclui-se as perspectivas sociais de grupos oprimidos e se essa exclusão contribui para o fortalecimento do silenciamento e perpetuação de desigualdades”.

 

 

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