04/08/2021
Atualmente, o espaço urbano é determinado por lei municipal, sendo o rural definido por exclusão à área urbana. Com base nessa diretriz, a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD) de 2015 diagnosticou que 84,72% dos brasileiros vivem em áreas urbanas e 15,28% em áreas rurais.
Contudo, essa metodologia de classificação dos espaços apresenta lacunas, por isso, o IBGE propôs o debate para a estruturação de uma nova tipologia de ordenação. Nela, também seriam utilizados critérios como a densidade demográfica, localização em relação aos principais centros urbanos e tamanho da população.
Por meio do cruzamento dessas variáveis, os municípios se classificariam em cinco tipos: urbano, intermediário adjacente, intermediário remoto, rural adjacente e rural remoto. Caso a nova tipologia seja adotada, 60,4% dos municípios do país se enquadram como rurais. Independentemente da metodologia, precisamos assumir que o Brasil é rural para termos políticas públicas que atendam a população que vive no campo e não condicioná-las ao que é pensado para os centros urbanos.
Desde o início da pandemia, muitos problemas sociais ganharam uma dimensão maior essencialmente no campo. A população está envelhecendo e trabalhando por mais tempo de maneira informal e com baixos salários. Os riscos à saúde, agravados pelo uso de agrotóxicos e a falta de saneamento básico, agora ganharam o desafio da COVID-19.
No campo, com as escolas fechadas e a dificuldade do acesso aos recursos para sustento das famílias, endurecido pela baixa escolaridade dos familiares e a evasão escolar, o trabalho infantil volta. Vemos os recursos escorrendo para as áreas urbanas em detrimento das áreas rurais.
Em um momento de esquecimento do campo no espaço de políticas públicas e os efeitos causados pela pandemia, lembremos da Marcha das Margaridas, movimento de resistência de mulheres do campo, da floresta e das águas do Brasil e da América Latina. No dia 12 de agosto de 1983, Margarida Maria Alves, presidenta do Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Alagoa Grande, na Paraíba, foi assassinada na porta de sua casa por denunciar abusos e desrespeito aos direitos das trabalhadoras e trabalhadores rurais.
Após 38 anos desse acontecimento, inúmeras mulheres rurais seguem sem seus direitos garantidos, com as desigualdades sendo potencializadas pela pandemia. A pesquisa “Sem parar: a vida das mulheres durante a pandemia” trouxe dados relevantes sobre as percepções de mulheres rurais. No campo, o “home office” não é trivial, primeiro pelas características das principais formas de trabalho, segundo porque é o local mais distante do acesso à tecnologia e informação.
Além disso, o trabalho executado pelas mulheres, muitas vezes é invisibilizado. De acordo com a PNAD, quase 63% das mulheres rurais estavam fora da força de trabalho, dado que possivelmente desconsidera as atividades das mulheres na agricultura, na criação de pequenos animais e na produção de alimentos.
Os poderes Legislativos e Executivos precisam pautar as políticas públicas para o campo, com o devido recorte de gênero. A população das cidades está crescendo e o campo está esvaziando; a agricultura familiar é um modelo de produção agrícola em processo de desaparecimento: o campo se esvazia, a população se urbaniza e os investimentos devem ir para a cidade, gerar condições de vida para essas pessoas e para os grandes projetos de produção de alimentos. O campo e as mulheres rurais não devem ser vistos como prestação de serviços para o meio urbano, ao contrário. Quanto menos se pensa na continuidade do Brasil rural, menos vida o Brasil urbano terá
Texto de Haline Floriano, voluntária da ONG.
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